MINI-HISTÓRIA SOBRE A POESIA

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POETISA, Eu...? (Minha 1ª poesia)

Me chamam de poetisa / Eu, que nunca fiz poesia / Insistem, me chamam de poetisa / E eu digo: mas eu nunca fiz poesia! /Não sei fazer estrofes, não sei rimar e se eu tentar... / amor rima com humor / Solidão com macarrão / sentimento com condimento / Soluços, com pinguços... / Eu não sei fazer poesia / Por que insistem nessa maestria?

Será que desvendaram minh'alma quimera/ Com loucos suspiros não ditos / Cabeça de leão e corpo de dragão? / Poetisa, eu...? / Por que insistem nessa galhardia? / Só se for de trigonometria / "Minha terra tem palmeiras onde canta o sabiá" / Seno a coseno b, seno b coseno a...

Marisa Queiroz

Minhas Crônicas

CENA CARIOCA

Manhã de outono, lindo dia de sol. Termino minha caminhada no calçadão e me dirijo ao quiosque para tomar água de côco com todas as promessas de sais minerais, carboidratos, proteínas, fibras, ferro, hidratação, etc. Respiro fundo, sinto-me bem: mais um dia de dever cumprido com meus exercícios. Enquanto espero que abram o côco, escuto uma voz de moleque atrás de mim:
_ Tia, me paga aí um lanche!
Desestressada e de bom humor, resolvi fazer o gosto do menino, que aparentava cerca de dez anos de idade. Vindo da classe carente, apresentava corpo franzino e cabelos muito desalinhados. A roupa, grande demais para seu tamanho, denunciava o jeitinho criativo, próprio dos necessitados.
_Diga aí o que você quer comer.
A despeito de seu aspecto desfavorecido, o garoto tinha algo peculiar e atrativo em seu semblante que só encontro em pessoas dotadas de uma forte auto-estima.
_ Hoje quero algo especial. Vê aquele quiosque de lá? É ali que vende o melhor cachorro quente da praia de Copa. Se a tia não se incomodar, faça o favor de ir até lá comigo.
Pega de surpresa, minha primeira reação foi a de pensar que aquele garoto era muito folgado. Ah, não iria lá e pronto! Ele que comesse o que tivesse neste quiosque aqui, ora bolas! Brinquei:
_ Tu queres mesmo que eu vá lá naquele quiosque da esquina, meu rei? Queres que eu te sirva também?
_ Que te custa, tia? Se vai fazer um bem, faz logo por completo.
Nova surpresa. Aquele pirralho conseguiu colocar-me em cheque comigo mesma. Malcriado, como ousa? Porém, como estava em meus melhores humores, resolvi aceitar o desafio e ver até onde ele me levaria.
_ Tá legal. Espere que eu termine meu côco e vou lá contigo.
_ Não se apresse tia, tenho todo o tempo do mundo! – disse sentando-se numa cadeira e entoando uma música pop qualquer.
Chegando ao referido quiosque, disse para o atendente:
_ Prepara aí o melhor cachorro quente da casa pro meu amigo aqui.
O meu novo amiguinho, no entanto, já havia se acomodado, confortavelmente, debaixo do guarda-sol, descansando as pernas em cima de outra cadeira. Quando me dei conta, já estava fazendo o papel de garçonete dele.
_ É só cachorro quente que você quer?
_ Claro que não, tia.  Manda ver uma fanta laranja bem gelada e me traz um copo com gelo e limão.
_ É pra já!
Não entendia porque, mas estava gostando daquele papel e procurei servir bem ao meu nobre cliente – afinal, clientes têm sempre razão, não é mesmo? Trouxe a fanta bem gelada e o copo com gelo e limão que ele pediu.
_ E aí, mais alguma coisa?
_ Tia, já que tu tá na empolgação, me traz um guardanapo para eu forrar a mesa que tá meio suja. Ah, sim, e fala pro cozinheiro que eu não gosto de cebola no molho. Só ketchup, maionese e mostarda. Se tiver batata palha, também pode ser.
Dado o recado, esperei junto com ele, sentada ao seu lado.
_ Como é seu nome?
_ José Washington da Silva Neves, ao seu dispor.
_ Cadê sua mãe e seu pai?
_ Minha mãe tá em casa, que rua não é lugar de mulher. Meu pai, por aí, catando lata pra fazer uma grana extra.
_ E você, não vai à escola?
_ Sempre que posso, tia. Hoje não dá, porque tive que dar um apoio ao velho. Catei umas latinhas do Posto Seis para cá. E ele me liberou pra descansar. Depois desse lanche, volto ao trabalho.
Seu olhar era de adulto e seu discurso, de responsável. Senti um misto de carinho e admiração por ele, mas uma ponta de preocupação por seu futuro e muita indignação por nosso sistema perverso e seus dirigentes não oferecerem oportunidades para aqueles meninos.
_ O que é que você quer ser quando crescer?
_ Quero ser forte e trabalhador feito meu pai, tia. Ah, sim, e ter uma mulher bonita pra  ficar em casa e criar meus filhos. Penso também em ganhar uma boa grana para trazer a patroa pra comer esse cachorro quente aqui comigo, todos os domingos. E tu, tia? Tu trabalha?
_ Não tanto quanto você.
_ Mulher tem que trabalhar em casa, tia.  O homem é que vai pra rua e faz o serviço mais pesado.
Terminou de comer seu cachorro quente, limpou a boca com o guardanapo, espreguiçou-se e cantarolou trecho de outra música pop qualquer.
_ Valeu, tia. O próximo fica por minha conta e eu te convido.
_ Valeu, José Washington. O prazer foi meu.

Fiquei olhando seu pequeno vulto desaparecer por entre outros muitos vultos do calçadão. Lá se ia mais um brasileirinho de boa índole, trabalhador e cheio de esperança para o futuro. Várias coisas haviam me impressionado nele: sua personalidade autoconfiante, seu jeito protetor com as mulheres, seu jeito prematuro de lidar com o outro e sua capacidade de tornar “especiais” as coisas que ele gostava. Devia sentir o amor dos pais, pensei, senão, o que faria com que me olhasse daquele jeito, com aquela certeza de que não seria rejeitado? Pequeno homenzinho vive se safando bem dos problemas do dia-a-dia e tem certeza que é dele o “serviço mais pesado”. Será que ele vai se conservar assim no futuro? E quando vier a adolescência e ele despertar diante de todas as perversas injustiças sociais? Como fará “uma boa grana” sem estudos e sem oportunidades? Apresentar-se-á ainda como José Washington da Silva Neves, “ao seu dispor!”?  Ou como mais um Zé Ratinho, “você perdeu!”? Quais instrumentos usará para ganhar dinheiro e levar a patroa para passear aos domingos? Resistirá às ofertas “tentadoras” oferecidas pela turma do tráfico? Que “serviço pesado” terá que fazer para ter uma “mulher bonita em casa”?  Será um prazer para a sociedade ou mais uma ameaça?
Fiquei pensando nas palavras que ele me disse: “se vai fazer um bem, faz logo por completo” - eu fiz um pequeno bem “por completo” e tive um grato retorno.  Nossos governantes poderiam aprender esta lição: façam o bem “por completo” para essas crianças carentes e suas famílias que a sociedade agradecerá. Que tal se o dinheiro “arrancado” do cidadão com tantos impostos for destinado, realmente, para a saúde e educação dessas crianças carentes e de suas famílias?
Que tal se o Mensalão for desviado dos bolsos dos gordos parlamentares para dar uma vida digna aos nossos brasileirinhos? Que tal se, ao invés de nosso sistema criar tantos Ratinhos e Elias Malucos, transformar nossos pequenos Josés e Joãos em trabalhadores orgulhosos de si, e de suas famílias?
Convido nossos governantes a pensarem: se ao invés de criar falsos programas de assistencialismos ou caridades do tipo Fome Zero, fossem criados recursos verdadeiros para investir nesses meninos e suas famílias, não estariam propiciando uma sociedade mais justa e menos violenta? Não é investindo que se lucra, plantando que se colhe e dando que se recebe?
Pois bem, a maneira de se conseguir uma civilização mais ética e mais humana no futuro é  investindo nesses brasileirinhos agora, “por completo”. O próximo bem, com certeza, será por conta deles. E a sociedade, ao invés de se envergonhar de seus representantes, muito agradecerá.


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DEPILAÇÃO PORNÔ


Cansada  de minha cabeleireira que parecia ter aprendido a fazer um único corte, com variações do tipo "mais curto e menos curto", resolvi experimentar um cabeleireiro de um salão que uma amiga me indicou. Gostei de cara de tudo o que vi. Ambiente limpíssimo, aparelhos modernos e novinhos, amplos espelhos e atendentes muito simpáticos.

Um certo requinte, sim, mas sem exageros, exceto pela voz da recepcionista no alto-falante para chamar os profissionais requisitados. Parecia a voz de Íris Lettieri no aeroporto Tom Jobim nos anos 80. Sensualíssima, porém, no caso dela, um tanto exagerada e com aquele sotaque  de carioca recém-saído das “patotas” de praia. Costumam acentuar o final  de cada palavra ou frase com um som que lembra uma sirene de carro de bombeiros ou talvez um mantra. Por exemplo, ela chamava os atendentes e profissionais assim: Cabeleireira Rejane, uma cliente a aguarda da recepçãoaumm... !  Sra. Aceita umcaféoaum...?  E por aí vai.

Depois de aguardar tomando meu cafezinho na recepção, finalmente chegou Denilso (sem ene no final mesmo!). Um amor de pessoa: lindo, loiro, e com uma das orelhas cheia de brinquinhos.  Superdelicado, levou-me até a seu cantinho e já foi me dando mil idéias de estilos e cortes para meu cabelo, que ele achou “de boa qualidade”, porém um pouco seco e precisando colocar uma cor mais “eletrizante” para combinar com minha pele e minha personalidade! Isso mesmo! Só de uma olhada, ele já soube tudo sobre mim!...
Que tal rouge verão? disse-me. Agradeci e disse-lhe que ia manter a cor que estava só pra não chamar muito a atençãosobre minha “personalidade eletrizante”.

Fez um excelente corte e - pasmem! -  de acordo com o que eu havia pedido. Nem mais nem menos. Resolvi então, já que estava ali, fazer as unhas das mãos e dos pés e escutei a voz daLettieri  carioca no auto falante: Bruna e Nelma, uma cliente as aguarda para manicure e pedicure, na cadeira deDenilsoaumm...!

Maravilha! Senti-me a própria rainha de Sabbat com três súditos, cada um cuidando de um embelezamento de meu corpo.  Soube de tudo que estava acontecendo nas novelas e com a vida pessoal dos artistas. Os três faziam questão de me mostrarem o quão aculturados eles eram em termos  de “vida televisiva”.
_ A Sra sabe que aquela atriz do cabelão da novela das oito, tá quase careca de tanto que ela usa tinta pra ficar loira ? Aquele cabelo já nem é mais dela. Ta cheia de aplique, e minha amiga que trabalha no salão que ela freqüenta, disse que muito em breve, ela vai ter que fazer um interlace – diz uma.
_  É, querida, mas pior é a da novela das sete que depois que encontrou o marido, aquele diretor da globo, na cama com outra, encheu a cara de botox. Dizem que nem pode rir mais! – diz a outra
_  É, esse povo de televisão é tudo assim. Vive tudo de aparência. Sabe aquela “popozuda” do Faustão? É tudo silicone. Tenho uma prima que mora perto dela e que me disse que anos atrás, ela era uma tábua de passar roupa – rebateu Denilsoprovocando risos entre os demais.

E eu, apenas para participar daquela pitoresca conversa, concordava com tudo, e fazia perguntas evasivas do tipo: É sério? Jura? Qual delas? – ou exclamações assim: Nossa! Não acredito! Puxa Vida!
Porém, não posso deixar de admitir que o carioca é muito criativo e divertido em suas fofocas! Não parei de rir um só instante. Nesses momentos não costumo revelar minha identidade profissional, pois ou eles deixam de ser espontâneos e se tornam desconfiados, ou querem ser analisados numa sessão de duas horas, pois fazem tudo lentamente para terem mais tempo para incluir um pequeno psicodiagnóstico de seus parentes e vizinhos. 

Depois  uma hora de sessão “cultural” com meus comparsas da fofoca,  finalmente, vi minhas unhas dos pés e mãos ganharem uma linda aparência rubra (cor que adoro!) e meu cabelo, lavado, cortado e escovado, prontinho pra provocar aquele fiu-fiu (sim, isso ainda existe!) de um gentil cavalheiro que me notasse.

Foi quando, olhando-me no espelho, percebi que faltava um pequeno detalhe: minhas sobrancelhas precisavam ser depiladas. Aproveitei a boa vontade do Denilso e perguntei-lhe se ele poderia fazer-me aquela gentileza, ali mesmo, com uma pinça, como minha antiga cabeleireira fazia.

Qual foi minha surpresa quando ele me disse: Vou chamar a especialista da casa!  Antes que eu me desse conta, escutei a voz da carioquíssima recepcionista falando no alto-falante:Depiladora Shirley, uma cliente a aguardoaum...!

Resolvi passar um baton e antes de terminar, escutei pisadas de saltos altíssimos às minhas costas. Virei  e deparei-me com uma enorme e ofuscante cabeleira vermelha (seria aquele o tomrouge verão?), com calças de lycra justíssima e um par de cílios que me lembravam dois leques chineses. Com um simpático sorriso, cumprimentou-me:
Dona Marisa é você, querida? Eu sou Shirley, especialista em depilação. Queira acompanhar-me por favor!

Segui-a sem muitos comentários imaginando onde ela me levaria. Subimos uma escadaria e lá em cima, fui convidada a entrar numa confortável sala de depilação com uma enorme cama, ar condicionado e muitos potes de cera depilatória. Um tanto apreensiva, fiz alguma perguntas e tivemos o seguinte diálogo:
_ Que tipo de depilação você faz, Shirley?
_ Todas, querida! De cima a baixo, deixo tudo lisinho!
_ Bem, no meu caso, eu quero só as sobrancelhas....
_ Claro, querida! Tudo bem. Vou deixá-las tão lisinhas que tenho certeza que depois você vai querer voltar e fazer o resto!...
_ Resto? Ah, você se refere às pernas, axilas e virilhas....
_ ...e à perereca também, meu amor! Deixo você do jeito que veio ao mundo!...
_ Você quer dizer....toda ela?
_ Deixo um bigodinho na frente que é pra dar um charme. O resto, dos grandes ládios até o anus, eu arranco tudo! E numa só puxada!...
_ Ui!...
_ Pode até doer um pouquinho na hora, mas depois, os prazeres que você vai sentir... Nunca mais vai querer outra coisa na vida, querida!...
_ Bem, eu acho que nem toda mulher tem essa coragem, não é?
_ Como assim, meu bem? Essa é a mais nova tendência da mulher contemporânea, a depilação pornô.  Os homens pedem, as mulheres adoram e não querem outra coisa.
_ Os homens pedem? Que tipo de homem pede isto?
_ Ué, meu amor, todos, principalmente os garotões. O meu filho, por exemplo, traz todas as namoradas para que eu faça depilação nelas. Já fiz em bem umas trinta. E elas ficam lindas! Poderosas!
_ Imagino! Mas, será que não é mais seguro preservar uns pelinhos que a natureza mandou como proteção?
_ Proteção de quê, meu amor? Quer se proteger da felicidade? Pra quê? Pra os vermes comerem depois?

Depois daquela argumentação da especialista em depilação pornô, resolvi encerrar o diálogo com a promessa de que, Sim!eu iria pensar seriamente sobre o assunto.  Já na rua andando apressada em minha volta para casa, escutei um fiu-fiu (sim, isso ainda existe!) em meu ouvido. Olhei e descobri um gentil cavalheiro a me olhar. Como sempre faço, sorri e continuei a caminhar. Só que desta vez um pensamento insólito instalou-se em minha mente: 

Será que aquele cavalheiro também estaria ligado naquela novatendência feminina? Teria ele  preferências pela depilação pornô?  Será que ele me achou com cara de “poderosa”? 
Sorri novamente e pensei:  _ Ainda bem que quem vê cara não vê coração!